Para a manutenção da ordem social, do equilíbrio, da harmonia entre os povos, e para o desenvolvimento das sociedades e das potencialidades humanas, faz-se necessário a institucionalização de métodos de controle social formais (direito) e informais (escola, igrejas, clubes, etc). Essa institucionalização se deve, principalmente, pela complexidade das relações sociais e da própria conflituosidade, e muitas vezes, da incapacidade humana de resolver os problemas através do diálogo e da compreensão.
O direito como produto da cultura humana, exerce papel de regulador e normatizador das relações humanas (controle social formal).
Assim, devido a incapacidade de resolução dos problemas através do diálogo e da compreensão da situação problema, as pessoas recorrerem ao Poder Judiciário para que possam dirimir os seus problemas.
Contudo, o Poder Judiciário passa por uma verdadeira crise de legitimidade e de hipertrofia.
A crise de legitimidade se dar pela incapacidade de resolução de problemas de forma célere, eficiente e por não cumprir o seu escopo principal que é a pacificação social.
Já a hipertrofia se deve a busca desenfreada pelo judiciário como se fosse a única forma de resolução das contendas. Não obstante o acesso à justiça seja uma garantia constitucional e hoje em dia as pessoas estão cada vez mais conscientes dos seus direitos, essa busca desenfreada do judiciário acaba tornando-o inoperável, devido, especialmente, a incapacidade material, humana e institucional de apresentar uma resposta efetiva, rápida e capaz de solucionar os conflitos.
Por isso, o direito reconhecendo a própria incapacidade do Judiciário de gerenciar os conflitos de maneira eficiente e celere, criou mecanismos de solução extrajudicial tais como a mediação, a conciliação, a arbitragem, os mecanismos de Dispute Board.
A reunião de todas as formas de solução de conflitos, judiciais ou não, compõe a ideia de justiça multiportas (multi-door justiça), cuja expressão tem origem americana sugerida por Franl Sanders, professor da Universidade de Harvard Law School.
Segundo o professor João Paulo Lordelo: “A premissa central aqui é a de que a “ a justiça estatal clássica, adjudicada pelo juiz, não é o único meio adequado para a solução dos conflitos. Ao lado da justiça de porta única, surgem novas forma de acesso: a justiça se torna multiportas. Nessa voa justiça, a solução judicial deixa de ter primazia nos litígios que permitem a autocomposição e passa a ser a ultima ratio, extrema ratio. Consequentemente, do acesso à justiça dos tribunais, passamos a acesso aos direitos via adequada de composição (IN: Noções Gerais de Direito e Formação Humanistíca. 7ª Edição. Salvador. Editora Juspodivm: 2023, pag. 93)
Contudo, não obstante a existência de uma justiça multiportas, no Brasil ainda se tem arraigado uma cultura litigiosa, de concentração dos poderes para impor solução apenas à justiça estatal clássica.
É necessário mudar essa concepção e reconhecer, cada vez mais, que os outros mecanismos consensuais de solução de conflitos são tão ou até mais eficiente que a heterecomposição clássica(Justiça Estatal).
Quanto a conciliação, o próprio judiciário tem reconhecido o relevante papel desenvolvido pelos conciliadores. Muitos tribunais, inclusive, criaram os CEJUSC – Centro Judiciários de Solução de Conflito(art. 165 e 166 do CP/2015). A figura do conciliador se fará presente quando inexistir vinculo prévio e anterior entre as partes. Nesse caso, a função do conciliador é sugerir a solução para o litigio (art. 165, §2º do CPC/2015).
Por outro lado, a mediação também é um importante instrumento de solução consensual dos conflitos. O mediador atuará quando já houver um vínculo anterior entre as partes. Ele auxiliará as partes a compreender a questões envolvidas e os interesses em conflitos (art. 165, §3º do CPC/2015).
Tanto a mediação quanto a conciliação são as partes envolvidas nos litígios e na situação problema que buscam a solução através do diálogo, da compreensão e do consenso. São muito comuns a conciliação e a mediação em ações de famílias, contudo, nas ações de consumo, demandas de natureza civil e até em questões envolvendo a administração pública, tem se buscado os métodos extrajudiciais de solução de conflitos (art. 1º da Lei nº 13.140/2015).
Já a arbitragem também é meio extrajudicial de solução de conflito no seu sentido clássico, contudo, ela é equiparada à Justiça, prova disso é que a sentença arbitral é considerada um título executivo extrajudicial. Ou seja, a arbitragem é um equivalente jurisdicional.
A arbitragem está regulada na Lei Federal nº 9307/96. Na arbitragem “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”(art. 1º da Lei 9307/96). A forma de institucionalização da arbitragem pode se dar pela cláusula compromissória da arbitragem (3º e 4º da Lei 9.307/96) ou quando as próprias partes escolhem um terceiro (arbitro) para resolução dos conflitos – acordo prévio de arbitragem(art. 6º da Lei nº 9.307/96). A arbitragem é muito utilizada em questões empresariais mais complexas e nas demandas envolvendo o poder público. São as Câmaras de Conciliação e Arbitragem que atuam na resolução das contendas.
Na arbitragem atua um arbitro neutro e imparcial e sua decisão tem força de título executivo judicial. Não obstante ser um equivalente jurisdicional, o descumprimento do título executivo judicial-sentença arbitral, deverá executada no Judiciário, uma vez que a realização coativa e a imposição de obrigação de fazer, invasão patrimonial, determinação compulsória de obrigar de pagar quantia certa, além de outras determinações materiais, ainda depende do Poder de Império do Estado através do Judiciário.
Por fim, o dispute board é “O dispute board (ou comitê de prevenção e solução de disputas) é um método alternativo de solução de conflitos que consiste na formação de um comitê de especialistas imparciais que acompanhará um projeto de longa duração desde o seu princípio. O objetivo do comitê é incentivar a prevenção e auxiliar na resolução de disputas durante todo o desenvolvimento do projeto em questão”( https://www.conjur.com.br/2021-mai-18/polidoro-dispute-board-opcao-disputas-alta-complexidade Acesso em 18 jun 23).
O método de dispute board também é muito utilizado na Administração Pública, especialmente nas questões envolvendo licitações e contratos administrativos, concessões públicas, parcerias-público-privada (PPP).
Assim, a composição amigável através da métodos de solução extrajudicial mostra-se salutar. Primeiro otimiza-se a resolução do problema restabelecendo-se o diálogo rompido entre as partes, através da compreensão da situação-problema; segundo, ganha-se em eficiência e agilidade e celeridade; terceiro desobstruiu o Judiciário deixando este Poder para resolver as questões mais complexas.
Ramom Edson Carneiro dos Santos
OAB/BA 41.222
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